Nostalgia

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Alguém bate à porta.

Ah, me lembro da minha infância:
Cada aroma, cheiro novo,
as cores vivas, meu mundo único
que eu criei naquelas tardes,
naquelas tardes brincando sozinho
no quintal de casa, embaixo das árvores

onde se escondiam fadas e dragões
onde a bravura me movia
e a euforia fortemente bradava
onde a imaginação era minha arma
onde o real pouco importava
e o céu se desfazia
ante minhas palavras.

Alguém bate à porta.

Passando disso, a liberdade púbere
com um mundo se estendendo ante meus olhos,
desdobravam-se novos horizontes
e minha solidão foi substituída
por camaradagem e romantismo,
com cores intensas e escuras,
onde a paixão se destacava.
Até que, sobre esse mosaico,
abateu-se uma grande mancha negra
que apagou todas as cores
que cobriam as paredes do meu quarto.
Grande agonia me acometeu,
a tristeza caiu sobre mim como a chuva.
Busquei abrigo, mas já era à noite
e todos dormiam. Todos dormiam,
ninguém me ouviu.
Curvado e chorando sobre a mancha
me surpreendi com uma luz
que resplandecia atrás de mim.
A luz branca invadiu a mancha negra
e logo a pintura sombria descascou
caindo sobre o chão e revelando
cores novas e mais vivas,
mais belas do que eu jamais vi:
Ao mesmo tempo suaves e sublimes,
como a brisa do mar;
Sem fim, mas bem definidas,
como uma floresta inexplorada.
Meus olhos se encheram de beleza,
e meu sorriso desabrochou
como uma rosa selvagem.
Minha mãos se ergueram ao céu
e eu toquei um anjo que passava.


Alguém bate à porta.

Aos poucos, a luz foi se desvanecendo
e meus olhos se escureceram.
As sublimes cores ainda estavam lá,
porém mais pálidas e ininteligíveis.
Os camaradas e os amores de antigamente
já haviam me deixado, mas só fisicamente:
Meu coração e minha mente ainda pulsavam por eles
mas meu sentimento valia tanto quanto o orvalho
que cai sobre uma poça de água.
Tudo me parecia enevoado
e meu discernimento se denegriu.
Limpei as lágrimas de meus olhos,
mas isso de pouco me serviu.


Alguém bate à porta.

Me levanto para abri-la,
  vejo o que eu temia:
Uma moça bonita, mas extremamente perigosa;
Seus olhos são negros e sua pele é cinza,
seu cabelo lhe caí suavemente sobre os ombros,
seu sorriso é gentil, mas seu olhar é cruel;
seus dedos são longos e finos, como galhos,
e sua aura preenche todo o ambiente.
A moça é a fúnebre Nostalgia
e sua visita já me é frequente.
Pouco a pouco, ela consome meu espírito.
Pouco a pouco, ela me mata a alma.
Pouco a pouco, ela me emagrece o corpo.
Pouco a pouco, ela envenena meu fígado.
Ela me mata, pouco a pouco, respeitando meu próprio ritmo.
E infelizmente, queridos velhos amigos,
essa é a melhor morte que eu poderia desejar.

Erick Galvão

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