Juventude e a chama revolucionária

A velhice, quando acompanhada da maturidade,  é a maior bênção ao alcance da mão humana. De agora em diante chamarei esta velhice de "experiência ".

A experiência me parece, em primeira e última instância,  um estado de sublime aceitação.  Em primeira instância porque o homem maduro deve começar a aceitar que é um homem mortal e que "já tem mais passado do que futuro ". No homem experiente isso concede uma grandiosa paz, pois nisso entende a perenidade da vida. Não à toa é mais comum ver as catedrais lotadas de anciãos e as baladas lotadas de jovens.  O homem experiente tem incrustado em seu espírito o Salmo 90, e isto o acalma.
Em última instância por como a mente e o corpo do homem experiente trabalha: Sua coluna de curva, subjugada pela gravidade à qual ela resistiu por décadas; sua saúde começa a ter falhas cada vez mais frequentes e graves, preambulando a eternidade que ela tanto rejeitou; mas, principalmente, é gradual o esquecimento da chama revolucionária no compasso em que a experiência alcança o homem. Quanto a isso, a experiência pode até vir desacompanhada da velhice física, mas é um fenômeno raro que não merece - ou melhor dizendo, eu não sou capaz de dar uma - explicação.
Afinal,  o que é essa chama revolucionária?  Ora, é aquilo que mais pesa sobre os ombros de um jovem. Conforme essa chama cresce, de acordo com o desenrolar histórico,  cresce também esse peso. Não por acaso a minha geração é marcada pelo maior índice de deficiências emocionais e problemas psicológicos.
Penso poder dizer, sem muitos problemas, que essa chama é inerente à qualquer jovem. Essa chama foi acesa pela primeira vez há muitos anos atrás,  mais do que história nos conta,  e desde então arde continuamente no altar e no mundo.
O piromaníaco da vez teve essa grande ideia no prólogo do mundo,  em algum momento antes da criação do Mundo - durante o grande tema de Iluvitar, Melkor ergueu sua voz em desobediência à grandiosa pauta que estava sendo escrita. Aconteceu quando, de certo modo,  quase todas as criaturas existentes eram jovens e não poderia acontecer de outro modo, pois esse é e sempre foi seu modus operandi: A chama tentou incendiar a única coisa que era sábia e certa do Universo - pois a revolução só ocorre contra aquilo que é,  em alguma instância, bom. Pois quando alguém ou alguma força tenta mudar algo que não é em algum grau visivelmente e intrinsecamente bom, ela tem o apoio de todas as partes,  exceto daquilo a que ela se opõe. Se Deus fosse mal, todos os anjos teriam seguido Lúcifer.
Pelo peso que tantas potestades impõem sobre essa chama, não é surpresa que ela seja uma das coisas mais pesadas na vida de um jovem - uma das coisas que os jovens usam como desculpa para negligenciar seu serviço existencial para com o Criador da existência.
Penso que é por isso que o homem maduro consegue ter o espírito mais leve que o jovem e a alma mais tranquila. Ousando citar um dos autores anti-cristão mais famosos do mundo, "a vida tornou-se-me leve, a mais leve, quando exigiu de mim o mais pesado."
É essa a maior bênção que vejo na velhice. Talvez a maior bênção que Jó tenha recebido tenha sido sua morte tranquila quando já era farto de dias.

Erick Galvão

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