Para meu filho, o profeta




Nossa história começou bem antes de eu te pedir para o Senhor. Desde pequena foi gerado em meu coração o desejo de ter você. Desde muito nova sonhava em ouvi-lo dizendo “mamãe”. Por vezes imaginei seu rosto, seu cabelo e sua voz. Fiz planos para você, meu filho, antes mesmo de cumprir os planos que eu tinha para mim. Você me motivava antes de nascer. Então, no momento certo, conheci seu pai. Ele sempre foi muito bom comigo. Ele me amava muito e era um homem muito gentil. Com a bondade dele me aproximei da bondade de Deus. Quando sentia o amor dele sentia também o amor de Deus. Admirava a devoção dele ao Senhor. Mas eu ainda te desejava. Contudo, com o passar dos anos, a frustração se ampliava. Foi muito tempo de tentativas, mas Deus ainda não havia me permitido gerar, por isso, seu pai precisou se casar novamente. Um útero estéril não poderia dar descendência, apenas humilhação, o que era recorrente. Isso me entristecia a cada dia mais. Não pude cumprir meu propósito para com meu marido e nem o sonho do meu coração. Meu marido ainda tentava me alegrar de todas as formas possíveis, mas ele não podia entender todos os sentimentos que se passavam dentro de mim. Quando a segunda esposa dele concebeu, foi adicionada a mim a vergonha. A cada dia minhas orações se intensificavam. Aquela situação não parecia correta. Dentro de mim eu sentia que precisava fazer algo. Tudo que estava ao meu alcance estava disposta a fazer.

Então, um dia, após orar e adorar na cidade como sempre fazíamos, algo me levou à entrada do santuário. Naquele momento orei como nunca antes. Sentia minha alma derramar meu sofrimento diante de Deus e meu interior ardia. Aquelas lágrimas pareciam vir do lugar mais profundo do meu ser. As palavras que proferia brotavam da minha boca da forma mais espontânea e sincera que poderiam brotar. Depois de tantos anos, eu me rendi de verdade. Naquele dia eu não só pedi por você, mas também te ofereci. Você era o sacrifício e eu era a lenha que o queimaria. Você seria o filho que não só me tiraria a vergonha da infertilidade, mas também me daria orgulho vivendo uma vida dedicada ao Senhor que te formou em um útero que não poderia gerar. Você seria dele. Foi essa a aliança que entre lágrimas e palavras eu fiz com Deus. Enquanto eu orava, um sacerdote se aproximou de mim por ter confundido meu quebrantamento com embriaguez. Então disse para ele que estava amargurada e que orava em desespero. Ainda estava com a vista embaçada pelo choro, mas olhei-o nos olhos e pude perceber sua compreensão. Ele me abençoou e pedindo para que o Deus de Israel me atendesse. Naquele instante, senti a amargura virar doçura, a tristeza virar esperança e a vergonha se diminuir. Quando o sacerdote ergueu a mão sobre mim eu tive a certeza de que o Senhor não negaria meu sacrifício. Você, meu filho, foi aroma suave para ele. Depois daquele dia meu espírito não se abateu mais. A certeza de que o Senhor me ouviu iluminou minha vida. E, então, você nasceu.

Ouvir você chorar ao nascer foi a consumação da transformação do meu pranto em alegria. Quando eu te olhei tão pequeno, tão frágil e tão melhor do que sonhei tive a certeza de que Deus é bom e que o tempo dele é melhor que o meu. Era o filho que eu roguei a Deus. Lembro de um dia em que te ninava nos braços e você fechava os olhos devagar. Comecei a acariciar seu rosto com o meu dedo e você sorriu para mim. Foi nesse ligeiro sorriso que eu soube que, por mais que tivesse planos para você, os Dele com certeza eram melhores. Você sempre foi dele. Eu te consagrei antes de te ter em meus braços. Quando te vi dando os primeiros passos em minha direção só conseguia pensar em quão longe aqueles pés iriam. Quando me chamou pela primeira vez só conseguia pensar em quantas bênçãos aquela boca pronunciariam. Você não entendia ainda, mas eu já falava isso para você. Eu te amei e ainda amo com todas as minhas forças, mas o amor de Deus pode fazer mais por você do que eu jamais poderia. Não posso dizer que não relutei com a ideia de te entregar, mas o Senhor foi fiel comigo, e eu seria com ele. Levei não só você, mas todas as ofertas que nossa lei orienta entregar em gratidão. Encontrei o sacerdote que fora a voz de Deus em meio a minha aflição, soltei sua mão da minha e entreguei aqueles dedos ainda tão pequenos na mão dele. Estava finalmente te queimando em sacrifício. Você não sabe disso, meu filho, mas eu chorei em todo o caminho de volta. Chorei pela saudade que ainda iria sentir e chorei porque sabia que grandes coisas Deus faria através de você.

Todos os anos, quando levava para você uma túnica, também levava minha bênção. Orava baixinho sobre o seu presente e proferia que você teria um legado regido por Deus e lembrado por gerações de homens. Você seria para o povo de Israel muito mais do que foi para mim. Por isso, quando um dia andava pela cidade com seus irmãos e ouvi o povo falando sobre o profeta que estava ganhando o respeito de todos, não tive dúvida de que era você. Meu filho, o profeta.

Hoje meus olhos já não veem tão bem e meus ouvidos já não ouvem muito, mas, quando olho para trás e penso em todas as lágrimas derramadas e em todos os insultos ouvidos meu coração se alegra, pois tudo isso foi encoberto pelo que tenho visto, ouvido e contado sobre você. Meu sacrifico abençoou minha nação. A vida que Deus gerou conduziu Israel. A que não podia conceber veio a conceber seis vezes. O que era seco veio a frutificar. E que em tudo isso e em todo o mais nosso Senhor seja louvado.

Ainda oro por você.

Com amor,
A agraciada.



Taínny Galvão

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